Jamais aprisionarão nossos sonhos
Nós tivemos antena
parabólica em 2000 com muito custo. Era difícil depender dos vizinhos para ver
os seus programas favoritos e parcelamos uma a perder de vista depois de
insistir para meus avós que aquilo era quase necessário.
Minha avó, quando meu avô faleceu, rodava mercados economizando centavos para dar
conta de colocar comida dentro de casa. Sim, nós íamos de mercado em mercado
sempre buscando os produtos mais baratos. Minha mãe ajudava ao seu modo. Vi
muitas vezes ela tirando casacos que eram pura naftalina do armário e os
colocando no sol para depois usá-los para que eu tivesse roupas novas durante o inverno. Aliás,
roupas e calçados só em duas épocas, junho e janeiro, apenas. Viajar não
era realidade, exceto quando tinha que acompanhar alguém doente para fazer
exames em Ilhéus e Itabuna.
Sempre estudei em
escola pública e isso me preparou para a vida. A realidade das pessoas que nos
rodeia é, por vezes, mais difícil que a nossa e isso me dava resiliência para
não reclamar da sorte. Minha mãe em 2006 teve a oportunidade de estudar
por um programa de formação de professores na UESC. Dividia apartamento com
outras pessoas para que os custos fossem mínimos e pudesse por fim ter um
diploma de graduação. Eu passei no vestibular em 2007 e cursei história na
mesma universidade que minha mãe. Peguei muita carona, andei muito de ônibus
lotado, passei horas na biblioteca, pagava acesso à internet para fazer
trabalhos.
Em 2009 minha avó
ficou doente e o que sustentou duas pessoas de uma mesma família na faculdade,
uma idosa doente e uma criança de seis anos em uma mesma casa foi termos bons
empregos na época, fruto do nosso suor. Minha avó deixou-nos de herança a casa,
construída com troca de doces por tijolos, numa época ainda mais difícil. E continuamos
a lutar muito para termos o que temos hoje.
Pessoas de “berço”
não entendem e nem nunca nos entenderão. Pessoas que nunca tiveram que
reutilizar roupas e calçados de outras pessoas não sabem o valor que damos por
coisas simples. Pessoas que sempre viajaram não sabe a alegria que é tirar
férias fora de casa. Pessoas que nunca tiveram que lutar para construir o que
tem hoje porque herdaram de alguém, não sabe o valor de cada centavo que se
ganha.
Pessoas simples
sempre lutarão e nunca se acovardarão. Pessoas simples jamais deixarão
aprisionar os seus sonhos.
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