Ode à Arnaldo Antunes


Preciso sentir. 
Carne exposta, dor, vulnerabilidade. 
Sentimentos, sabe? 
Ando muito anestesiada com a rotina diária que tem se resumido a levantar e trabalhar, olhar os memes durante os intervalos do trabalho, almoçar sozinha a comida que trago de casa, olhando o relógio para não perder a batida do ponto, nova rodada de trabalho, vivendo entre o sono e a vontade de não produzir mais nada depois que comi, então me drogo com porções cavalares de cafeína que me manterá acordada até altas horas da madrugada e das quais irei me arrepender depois. Tudo isso, cinco vezes na semana.
Sábado encho a cara com amigos que falam apenas de trabalho, relacionamentos e frustrações. Um sexo casual rola de vez em quando, mas tenho cada vez menos gostado dos homens que encontro, a tal ponto de pensar em como o neoliberalismo tem fodido a gente enquanto o moço tenta foder a minha boceta lá embaixo. Não, não estou virando lésbica, Deus não me deu essa oportunidade maravilhosa de nascer não gostando de homens!
Domingo curto uma ressaca filha da puta que me come os órgãos internos e me faz desejar nunca mais ingerir qualquer substância alcoólica nesta e nas outras existências. E enquanto ouço Bob Dylan e fumo um cigarro que piorará minha situação, planejo na minha agenda a semana igual que terei a essa e que foi igual a penúltima e todas as 56 semanas do ano.
Preciso sentir. Sentir algo novo, experimentar qualquer coisa diferente. Talvez eu mude o cabelo, talvez eu fique feliz, né Arnaldo Antunes? Só preciso sentir algo. De tantos sentimentos deve ter algum que sirva.

Júlia Siqueira

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