Maquiagem de dor
Ah meu querido, eu não consigo fazer com que as coisas doam como você.
Perdi a teatralidade, o tato, o jeito de emocionar o outro com feições estranhas
e caretas, mas por outro lado aprendi a esconder as coisas com muitas camadas
de verniz emocional e de base. Base líquida clara e batom vermelho que, segundo
um tutorial na internet, induz segurança de si. E assim sigo. Podre por dentro,
mas linda por fora. Vivemos o mundo das aparências, esqueceu darling? Entre uma foto instagramável, um
stories cheio de detalhes e um jazz melódico há muita dor escondida, porém
preciso que seja assim, terei que fazer com que aconteça dessa forma, uma dor de manhã de
domingo com café forte e não de uma noite de sexta, que impeça o meu sushi com
sakê de morango. Um dia, talvez, eu queira (re) aprender a sofrer de forma ostensiva,
para que as pessoas sejam benevolentes com o meu padecer. Quando isso acontecer
quero as olheiras fundas como dois lagos de águas escuras, a palidez de
um moribundo e lágrimas de carpideiras ao meu redor. Mas hoje não. Hoje,
quero falsas alegrias e muita maquiagem. Pó aplicado na cara e na vida. Quem sabe um dia...
Júlia Siqueira
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