Repartições do coração
Quando eu tinha menos da idade do que hoje tenho, acreditava que
qualquer sorriso bonito de dentes alinhados e conversa solta pudesse receber o
nome de amigos. Talvez hoje não mais, quer dizer, não com a mesma intensidade.
Acabo que continuo chamando todos de amigos, mas agora fico categorizando os
amigos em sub-repartições numa escala de importância que inventei num domingo
tedioso ou enquanto o espera o dentista nos atender.
Com o tempo a gente acaba ficando muito exigente para as coisas e de
certa maneira invertendo a ordem de tantas coisas. Antes amigos para sempre e
para tudo, hoje amigos para o momento. E retiro da caixa os amigos que me
atenderão naquela situação em específico. É tudo questão de organização, não me
tire por uma pessoa fria e calculista.
Mas há aqueles que dentro dessas subdivisões, são especiais. Esses a
gente conta para ver sempre. São aqueles que você pode levar para uma banca de
bar para discutirem por horas Freud, saúde pública, a situação do planeta,
política, arte, religião e filosofia e em nenhum momento você se lembrará de
falar de pessoas, porque as coisas e o mundo lhe são mais importantes do o
mundo alheio. E você fala de si, apenas pelo fato de que gostamos de falar de
nós mesmos e ouvir o que o seu amigo tem para falar dele. E entender que podem
passar dias, meses, anos, a coisa é igual. Esse para mim é o significado de ter
amigos hoje, talvez com o tempo, falaremos diferente, afinal estamos mudando o
tempo todo, não é mesmo?
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