Uma dose de paixão


A paixão é um dos maiores enganos da humanidade, aquele fogo que incendeia o seu corpo e lhe deixa febril, delirante, numa febre que não passa nem com mil antitérmicos. Já me apaixonei tantas vezes e quebrei a cara outras tantas, com esses mergulhos profundos que a gente dá em bacias com água pela metade. Não que foi ruim, pelo contrário, foram muito bons. O flerte, a troca de olhares, os beijos, o sexo, porém quando tudo isso acaba eu precisava de algo mais, pois parecia que em cada gozo minhas energias precisavam ser reabastecidas, não de mais uma rodada do sexo-brutal-pré-histórico, mas de silêncio e de paz.
E na paixão você não encontra sossego. Você fica antenada todos os dias, uma doente virtual buscando formas inimagináveis de corresponder aos anseios do outro. E se eu fizer desse jeito, e se experimentar esse novo brinquedo sexual, e se eu acender um palo santo no apartamento, fazer um jantar especial... O subjuntivo vira uma presença constante em seu vocabulário, como se a partir dali em sua vida só existisse esse modo verbal.
Você vive uma vida cheia de incertezas, sabe, porque isso de início lhe motiva, o arriscado nos amedronta e ao mesmo tempo nos excita, mas com o tempo cansa, porque a gente cai na besteira de se apaixonar mil vezes e por pessoas completamente opostas e fica num ciclo interminável de que ele vai ser o cara de minha vida, contudo eu morro para mim mesma e para todas as versões que eu invento de mim, antes daquilo sair do mundo de minhas abstrações malucas e pular para uma realidade palpável e apalpável, enquanto o príncipe vira sapo e eu busco outro antes de minha carruagem se transformar em abóbora.
A paixão é a droga, um ópio viciante que nos anestesia do mundo careta que desenharam para nós. E como viciados, mesmo sabendo de seus riscos, utilizamos à exaustão. 
Até a próxima overdose.

Júlia Siqueira

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